Desembargadores analisam experiência no segundo julgamento de impeachment de SC - Imprensa - Poder Judiciário de Santa Catarina
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Menos de seis meses após protagonizar, ao lado da Assembleia Legislativa, o primeiro Tribunal Especial de Julgamento na história de Santa Catarina, o Poder Judiciário de Santa Catarina (PJSC) foi encarregado de definir o futuro do Executivo estadual novamente. Desta vez, apenas o governador era réu por crime de responsabilidade no processo referente à compra de 200 respiradores pulmonares, com pagamento antecipado de R$ 33 milhões. Além do desembargador Ricardo José Roesler, chefe do PJSC e presidente do Tribunal, Sônia Maria Schmitz, Rosane Portella Wolff, Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Roberto Lucas Pacheco e Luiz Zanelato foram os desembargadores sorteados e encarregados de representar o Judiciário no Tribunal Misto.
Os magistrados, que representaram 50% do foro, tinham a incumbência de deliberar primeiro sobre a admissibilidade da denúncia, o que ocorreu por seis votos a favor contra quatro pedidos de arquivamento. Apesar do placar se repetir na sessão final, em 7 de maio, Carlos Moisés foi absolvido - era necessário mais um voto a favor do afastamento para que o governador fosse destituído definitivamente. A outra metade do Tribunal foi composta por deputados estaduais: José Milton Scheffer (Progressistas), Valdir Cobalchini (MDB), Fabiano da Luz (PT) e Laércio Schuster (PSB).
Findado o processo e finalizados os trabalhos do segundo Tribunal Especial de Julgamento do Estado, os desembargadores analisam suas experiências:
Desembargador Ricardo Roesler, presidente do Poder Judiciário de Santa Catarina
Por obra do destino, em menos de seis meses depois de presidir o primeiro, presidi também o segundo Tribunal Especial de Julgamento de Impeachment da história do Poder Judiciário de Santa Catarina. Superados os embaraços do ineditismo, a ocasião exigia serenidade e determinação principalmente pela relação com a pandemia e a saúde da população. Novamente foi uma honra compartilhar o momento com notórios colegas do Judiciário e membros do Parlamento catarinense. Os julgadores representantes dos Poderes tiveram a oportunidade de aprender e aperfeiçoar os conhecimentos técnicos, jurídicos e políticos buscando a melhor solução de acordo com suas livres convicções.
Mais uma vez, ficou clara a mensagem de que no Estado de Direito em que vivemos, as instituições estão sólidas, e funcionando no cumprimento do dever, do poder pelo dever. O diálogo republicano entre as instituições ficou como marca indelével nessa experiência. Que fique de lição para a posteridade: sem instituições fortes e independentes e sem diálogo não avançamos, não evoluímos, não chegamos a lugar nenhum. Haverá sempre entraves, diferenças, dificuldades e obstáculos a superar, mas a estabilidade política, econômica e social se constrói com o diálogo republicano que valoriza em última análise a cidadania.
Como disse ao final do primeiro julgamento do Tribunal, em 2020, nesse processo político-jurídico, as nossas decisões foram o resultado do equilíbrio entre o que se adota no parlamento e o que se pratica no Poder Judiciário.
Desembargadora Sônia Maria Schmidt
Aceitei o munus de julgar o Processo de Impeachment (Representação n. 002.6/2020), motivada pela composição sorteada, todos companheiros que honram o Poder Judiciário catarinense e principalmente pela Instituição. Como de hábito, estudei com dedicação o processo oriundo do Parlamento catarinense e, com serenidade e responsabilidade social, alcancei a decisão, tarefa que considerei complexa e muito dificultosa, dadas as consequências envolvidas.
Elaborar o voto, após densa pesquisa, foi deveras trabalhoso, embora houvesse contado com o irrestrito apoio da assessoria do meu gabinete. Conclui o julgamento, enriquecida pelas lições transmitidas pelos colegas, pela nobreza do companheirismo, pelo alcance do resultado e da verdade, nunca absoluta e, nesse sentido, inalcançável para nós seres humanos, falíveis pela nossa própria natureza.
Desembargador Roberto Lucas Pacheco
Fazer parte de um julgamento que ficará marcado na história de Santa Catarina representou, de um lado, uma grande honra, mas, de outro, uma imensa responsabilidade. O processo de impeachment está se tornando mais usual apenas recentemente, sendo formatado com certa dificuldade, pois a lei é bem anterior à promulgação da Constituição Federal e precisou ser interpretada com base nos princípios constitucionais vigentes. E não se pode afastar o aspecto político que contrasta muito com o viés técnico adotado pelos integrantes do Poder Judiciário em sua lide diária.
Por isso, a direção serena e segura do presidente do Tribunal e a cooperação e competência dos nobres desembargadores e deputados que, comigo, integraram o Tribunal Especial de Julgamento, bem assim de nossas valorosas assessorias, foram fundamentais para se chegar a um bom termo. Penso que o Poder Judiciário de Santa Catarina deixou patente sua independência e seu comprometimento com a justiça, razão de sua credibilidade perante a sociedade catarinense.
Desembargador Luiz Zanelato
Contemplado aleatoriamente, por sorteio, entre noventa e quatro desembargadores do Tribunal de Justiça, para integrar o tribunal especial, com atribuição de julgamento do segundo processo de "impeachment" instaurado contra o governador do Estado ao longo da história política de Santa Catarina, representou, para mim, um inédito e instigante desafio.
Encarei-o com naturalidade e consciente da dimensão da responsabilidade que o envolvia, haja vista as potenciais repercussões dele decorrentes. Denúncia por quatro delitos de responsabilidade distintos, em feito vertido em 9.455 folhas (132 volumes). Trabalho hercúleo a absorver toda a equipe de gabinete. Deste episódio marcante, duas impressões, pelo menos, merecem registro. Uma, durante o processo, foi pedra de toque o relacionamento harmônico, porém, independente entre os membros dos Poderes Legislativo e Judiciário, em fiel sintonia ao Estado Democrático de Direito.
Outra, igualmente importante. O impeachment, recepcionado pela vigente Carta Magna, rege-se por legislação concebida sob inspiração da Constituição de 1946, quando o Brasil ainda era um país agrário, possuía realidade econômica, social e política muito diferentes das atuais. Arcaica e anacrônica, a Lei nº 1.079, de 10/04/1950, que define os crimes de responsabilidade, requer reformulação e adequação à realidade contemporânea. Com efeito, confere-se ao instituto do "impeachment" índole eminentemente política, pois objetiva apurar e reprimir infrações político-administrativas praticadas por agentes políticos. Nesta perspectiva, ouso dizer que a formação, na jurisdição dos estados-membros, de tribunal híbrido, com parlamentares e magistrados, não se justifica, vez que, na análise e julgamento de crimes de responsabilidade, tendem a aflorar e ganhar corpo aspectos de conveniência e oportunidade de interesses políticos voltados para a governabilidade, seara alheia e na qual não se imiscui o ofício dos juízes, caracterizado pela isenção e independência, que formam seu convencimento exclusivamente com base no estudo e exame dos fatos, das provas e do direito aplicável ao caso concreto. Portanto, a incumbência de tal julgamento deveria ser reservada aos parlamentares, detentores de mandato conferido pelo voto popular, a exemplo do que ocorre no âmbito federal, em que uma das casas legislativas autoriza, e a outra, julga o processo; na esfera estadual, mantida a atual atribuição das assembleias legislativas, a ideia é que os parlamentares da unidade federativa, com mandato federal, julguem o processo. À neutralidade do Judiciário, apenas ficaria a tarefa de presidir o ato de julgamento. Necessário, também, um regramento processual claro e definido, a prever, inclusive, recursos das decisões proferidas na condução e no julgamento do processo, em conciliação com o princípio do devido processo legal.
Desembargadora Rosane Portella Wolff
Recebi com serenidade o sorteio para integrar o Tribunal Especial de Julgamento, assim como para ser a relatora do processo de impeachment, o qual representa um marco na história jurídico-política no Estado de Santa Catarina. Por ser um processo de natureza jurídico-política, tratava-se de mais um desafio, dentre tantos outros vivenciados em meus 30 (trinta) anos de magistratura. Contudo, a análise do processo, detida e atenta, com muita responsabilidade, não deixou de ser praticada. Hoje me sinto honrada por ter participado desse momento histórico, também para o Judiciário catarinense, bem como sou grata pela oportunidade de angariar mais conhecimentos. Me vem à mente nesta quadra, o que trago comigo desde quando iniciei a magistratura, nas palavras de João Alfredo Medeiros Vieira, em sua "Prece de um Juiz", ao exortar: "Senhor, Fazei da minha toga um manto incorruptível. E da minha pena não o estilete que fere, mas a seta que assinala a trajetória da Lei no caminho da Justiça". Missão cumprida!
Desembargador Luiz Antônio Zanini Fornerolli
Confesso que, quando do sorteio realizado, fiquei perplexo com a possibilidade de julgar - ainda que pela prática de crime político - o governador do Estado de Santa Catarina. Quando aprovado no concurso público - e aí se vão quase 28 anos - jamais cogitaria participar de um julgamento de tal quilate, com repercussões inegáveis em toda sociedade catarinense. Contudo, como traço marcante da própria judicatura, não poderia declinar de tão valorosa missão que me foi incumbida.
Com o início dos estudos sobre os autos, a surpresa inicial deu lugar a uma análise minuciosa e criteriosa a respeito dos fatos narrados na exordial acusatória. Embora exaustivo, haja vista a quantidade infindável de documentos aportados, o trabalho não se distanciou tanto daquilo que vejo no dia a dia da prática forense. Isso deu tranquilidade para proferir um voto seguro e tranquilo, na certeza de que estava agindo de acordo com minha convicção íntima e baseada primordialmente naquilo que os autos nos apresentavam.
Como legado disso tudo, posso seguramente assegurar que o Poder Judiciário catarinense, chamado como foi para cumprir sua função legal/institucional - seu poder/dever -, demonstrou, como não poderia deixar de ser, sua independência funcional, imparcialidade e preocupação com o bem público, proferindo votos tecnicamente escudados, deixando sempre muito claro que os mandatos são outorgados pelo povo e para o povo, de modo que qualquer desmando pode e deve ser objeto de apuração pelas instâncias competentes, como de fato o foi.
Conteúdo: Assessoria de Imprensa/NCI
Responsável: Ângelo Medeiros - Reg. Prof.: SC00445(JP)